Avulsão e Direito de Propriedade: O Que Fazer Quando a Natureza Transforma os Limites do Imóvel

No mundo do Direito Imobiliário, é comum lidar com situações que envolvem compra e venda de imóveis, contratos, registro em cartório, inventários e questões condominiais. No entanto, a natureza também pode interferir na delimitação e na extensão de uma propriedade. Um exemplo interessante disso está previsto no art. 1.251 do Código Civil, que trata da chamada avulsão — uma forma específica de acessão causada por forças naturais violentas.

Neste texto, vamos entender o que diz a lei, como aplicar essa regra na prática e quais são os direitos e deveres dos proprietários envolvidos quando um pedaço de terra é deslocado por um fenômeno da natureza e acaba se unindo a outro imóvel.


O que diz o art. 1.251 do Código Civil

O artigo é objetivo:

“Art. 1.251. Quando, por força natural violenta, uma porção de terra se destacar de um prédio e se juntar a outro, o dono deste adquirirá a propriedade do acréscimo, se indenizar o dono do primeiro ou, sem indenização, se, em um ano, ninguém houver reclamado.

Parágrafo único. Recusando-se ao pagamento de indenização, o dono do prédio a que se juntou a porção de terra deverá aquiescer a que se remova a parte acrescida.”


Acessão por Avulsão: uma introdução simples

A avulsão é um tipo de acessão natural, ou seja, um acréscimo à propriedade que acontece sem intervenção humana, provocado por fenômenos da natureza. Neste caso, trata-se de uma força natural violenta, como uma enchente, um deslizamento de terra, uma enxurrada ou um vendaval que provoque o deslocamento de parte do solo de um imóvel para outro.

Esse pedaço de terra que se desprende pode conter vegetação, árvores, ou até parte de uma lavoura, e acaba se fixando no terreno vizinho. O Código Civil busca, com esse artigo, dar uma solução prática e justa para esse tipo de situação.


Como fica a propriedade da terra deslocada?

De acordo com o art. 1.251, quem recebe o acréscimo não se torna automaticamente proprietário da nova porção. A aquisição só se consolida em duas hipóteses:

  1. Se indenizar o proprietário original, ou seja, o dono do imóvel de onde a terra se destacou.

  2. Se ninguém reclamar a restituição da terra dentro do prazo de um ano.

Portanto, o direito de propriedade não é imediato. O possuidor do imóvel que recebeu a terra deve observar esse prazo e, preferencialmente, buscar o acordo com o proprietário prejudicado.

Esse mecanismo serve para proteger os direitos do dono da terra original, que perdeu parte de seu imóvel por um evento natural, mas sem ter dado causa a isso.


O prazo de um ano: o que significa?

A contagem desse prazo de um ano é essencial para consolidar a nova situação.

Durante esse período, o dono do imóvel que perdeu parte da terra pode se manifestar e reivindicar sua restituição ou ser indenizado. Caso ele permaneça inerte por um ano, perde o direito de reivindicar, e o vizinho passa a ser proprietário definitivo do acréscimo, mesmo sem pagamento.

É importante ressaltar que, para que a terra deslocada seja incorporada sem indenização, é necessário que:

  • O evento tenha sido natural e violento (ex: tempestades, enchentes, deslizamentos);

  • A terra tenha se fixado de forma permanente ao imóvel vizinho;

  • O proprietário original não tenha reclamado durante o período de um ano.


E se o dono da terra se recusar a indenizar?

O parágrafo único do artigo traz uma solução interessante e justa:

“Recusando-se ao pagamento de indenização, o dono do prédio a que se juntou a porção de terra deverá aquiescer a que se remova a parte acrescida.”

Ou seja, se o vizinho que recebeu a terra não quiser pagar ao dono original, ele não poderá manter o acréscimo. Deve então permitir que a terra seja removida, desde que isso seja possível tecnicamente e não gere mais prejuízo.

Essa regra busca equilibrar os interesses. De um lado, reconhece o direito do proprietário prejudicado de ser compensado; de outro, protege o novo possuidor de assumir obrigações excessivas se o acréscimo não for significativo ou vantajoso.


Questões práticas e exemplos

Vamos imaginar uma situação rural: um deslizamento provocado por chuvas intensas faz com que parte da encosta de um terreno agrícola desça e se una à propriedade de baixo. A terra carrega consigo uma área de pasto e algumas árvores.

Nesse caso:

  • O proprietário da parte inferior poderá usar temporariamente essa área, mas precisará:

    • Indenizar o vizinho, ou

    • Esperar um ano, sem contestação, para se tornar dono definitivamente.

  • Se o dono da terra de cima pedir a devolução antes de um ano, o vizinho terá duas opções:

    • Pagar pela terra, ou

    • Permitir que ela seja removida, se possível.

Essa situação pode gerar dúvidas, especialmente quando envolve grandes áreas, impacto ambiental ou bens fixos, como cercas ou instalações agrícolas. Nestes casos, a recomendação é sempre buscar assessoria especializada, tanto jurídica quanto técnica.


Considerações finais

O art. 1.251 do Código Civil é um bom exemplo de como o Direito busca responder a situações inesperadas causadas pela natureza, sem abrir mão da justiça e da segurança jurídica. Ele reconhece que o limite de um imóvel pode mudar sem a vontade do proprietário e que, ainda assim, os direitos envolvidos devem ser respeitados.

Para quem vive ou possui imóveis em áreas suscetíveis a fenômenos naturais — como encostas, regiões ribeirinhas ou terrenos em aclive —, é fundamental conhecer esse artigo e estar atento às alterações físicas que o tempo e a natureza podem provocar.

Além disso, registrar a ocorrência, conversar com o vizinho afetado e formalizar acordos por escrito são atitudes prudentes que evitam conflitos futuros e judicializações desnecessárias.


Se você gostou deste conteúdo, continue acompanhando nosso blog para mais textos sobre Direito Imobiliário explicados com clareza e base legal. Toda semana trazemos interpretações atualizadas do Código Civil, sempre com exemplos práticos e linguagem acessível.

Até o próximo artigo!

Para ler mais artigos como esse, acesse nosso site oficial: Thales de Menezes

Palavras Chave: Advogado imobiliário, Escritório em Goiânia, Advogado de inventário, Direito imobiliário, Direito de inventário



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A Compra de Imóvel por Empresário Individual

Construções e plantações em terreno alheio: o que presume a lei?

Imóvel Considerado Bem de Família Poderá Ser Penhorado